Os melhores livros de 2012
O suplemento Ípsilon, do jornal Público, selecionou os vinte melhores livros de 2012.
Aqui encontras a lista dos dez primeiros livros,
e respectivas críticas escritas pelos colaboradores do jornal.
Podes aceder à lista completa aqui.
1. O Bom Soldado, Švejkde Jaroslav Hašek
Este romance, como Jaroslav Hašek o pôde escrever
entre 1921 e 1922, é a grande comédia do nacionalismo moderno e do seu
belicismo inato: a catástrofe da Primeira Guerra Mundial vivida por Švejk - um
"idiota oficial" que parece derivado (via popular) do famoso Cândido,
de Voltaire. Mesmo atirado para a prisão, com brutalidade e sem motivo, comenta:
"Isto aqui não é assim tão mau. Esta tarimba é de madeira afagada."
Ao pé das arbitrariedades atravessadas pelo subalterno Švejk, a ideia do estado
de excepção, que Agamben anda a vender há anos, mal chega para assustar
crianças. O riso constante nunca tapa a tragédia vigente e declara a cada passo
que ela é de facto ridícula e, afinal, estúpida e rasteira. O seu único símbolo
é este "herói aleijado", contemporâneo dos K. e dos Samsa mas em cuja
língua (checa e alemã) se pode escrever "Para a guerra nós não vamos, para
ela nós cagamos." Agora, que recai "sobre a Europa a verdade de que o
amanhã desfaz os planos do presente", este Švejk, cujo tradutor pôs no
topo da colecção humorística de Ricardo Araújo Pereira, é vital para a nossa
paz de europeus sem ilusões. G.R.
2. Já Então a Raposa Era o Caçador, Herta Müller
Nesta alegoria trágica são silenciosas as ruas do poder. Há sombras amargas na noite daquela cidade insana. Como uma presença maligna e demente, o medo atravessa os dias, entranha-se, faz-se de morto. Uma realidade que a escrita de Müller acorda e estilhaça. As palavras adensam-se, já só há linguagem simbólica, magma onírico. Entre o silêncio e a escrita. J.R.D.
3. A Piada Infinita, David Foster Wallace
Foster Wallace desejou construir, à semelhança de
Shakespeare - a quem roubou o título, a partir de uma fala de Hamlet sobre
Yorick, o bobo que dizia verdades inomináveis - uma cosmogonia delirante e tão complexa
como o mundo. Terá morrido ao tentá-lo, mas o resultado reflecte bem a sua
ousadia. H.V.
4. Arco-Íris da
Gravidade, Thomas
Pynchon
Em tempo de caudalosos rios de informação e de
calhamaços leves, 39 anos depois de publicado originalmente, este livro chega a
Portugal ainda com fôlego para nadar contracorrente nesses rápidos binários que
nos encandeiam e desafiar os nossos limites como leitores. Ninguém sai da
experiência incólume, que para isso está a grande literatura. A.R.
5. Contos
Completos, Lydia
Davis
A ausência de enredo que caracteriza os contos
breves de Lydia Davis mais não é do que uma maneira hábil de esconder a
desolação metafísica em que as personagens se debatem. Com uma escrita lúcida,
concisa e original, e num tom que é uma máscara para o reconhecimento da
impossibilidade da felicidade, Davis consegue contornar as expectativas
imediatas dos leitores. J.R.D.
6. Mel, Ian McEwan
Uma extraordinária capacidade narrativa, a criação
de uma personagem feminina credível, a reconstituição de uma época (anos 1970)
feita de medo, desconfiança, logro e traição. Um romance histórico, um
thriller, uma reflexão sobre o Zeitgeist em que o autor questiona continuamente
as ingerências da realidade na ficção e vice-versa. H.V.
7. Todas as Palavras, Manuel António Pina
O caminho foi sempre o da procura da palavra. A
certa. Desde 1974, quando começou a publicar poesia com um título cujas
palavras, no momento desta escrita, são só sentido, como ele queria: Ainda Não
É o Princípio Nem o Fim do Mundo Calma É Apenas um Pouco Tarde. Manuel António
Pina morreu em Outubro deste ano e deixou Todas as Palavras, a antologia
poética. Uma casa. I.L.
8. Um Sopro
de Vida (Pulsações), Clarice
Lispector
Clarice Lispector escreve como ninguém. É uma clave
verbal diferente - desde o primeiro livro até este, o último, editado já depois
da sua morte em 1977, e escrito e/ou ditado à sua grande amiga, Olga Borelli
(em parte no hospital, até ao dia antes de morrer). Este livro, e Clarice sabia
que estava a morrer, densifica e depura, intensificando pungente e
dramaticamente os traços da escritora. De uma beleza lancinante. M.C.C.
Um prédio de águas rejuvenescedoras na Luanda
perdida pelo dinheiro, acossada pela ambliopia, condenada ao fogo pela
ganância, onde transparência e leveza servem o paradoxo de emprestar
visibilidade a quem até aí nem se via. A maturidade com que Ondjaki trabalha o
português angolano é digna dos melhores ourives da língua. A.R.
10. (ex-aequo) Os Enamoramentos , Javier Marías
Ao 13.º romance, o catalão Javier Marías volta com
a voz de uma mulher, María Dolz, para falar de amor. Funcionária de uma
editora, este primeiro "eu" feminino de Marías entretém-se a observar
a felicidade de um casal enquanto toma o pequeno-almoço no sítio de sempre. Com
este livro, Marías quebrou a promessa de abandonar a literatura. Não precisa de
se redimir. I.L.
10. (ex-aequo) Poesia Reunida, Maria do Rosário
Pedreira, Quetzal
Maria do Rosário Pedreira era, até Poesia Reunida
sair este ano na Quetzal, daqueles poetas que têm uma legião de fãs mas toda a
obra esgotada. Só por isso, este livro já era imprescindível. Mas além de A
Casa e o Cheiro dos Livros (1996), O Canto do Vento nos Ciprestes (2001) e
Nenhum Nome Depois (2004), Poesia Reunida traz um livro inédito, A Ideia do
Fim. Mesmo perante o fim, há ressurreição nesta nova fase - mas sem se perder o
medo. I.C.
Escolhas de António
Rodrigues, Diogo Ramada Curto, Gustavo Rubim, Helena Vasconcelos, Isabel
Coutinho, Isabel Lucas, José Riço Direitinho, Luís Miguel Queirós, Maria
Conceição Caleiro e Rui Lagartinho (da lista completa)
(Textos retirados de http://www.publico.pt/cultura/noticia/os-melhores-livros-de-2012-para-o-ipsilon-1578633)
Vem descobrir alguns destes livros na nossa Biblioteca.
Boas leituras!
1. O Bom Soldado, Švejkde Jaroslav Hašek
Este romance, como Jaroslav Hašek o pôde escrever
entre 1921 e 1922, é a grande comédia do nacionalismo moderno e do seu
belicismo inato: a catástrofe da Primeira Guerra Mundial vivida por Švejk - um
"idiota oficial" que parece derivado (via popular) do famoso Cândido,
de Voltaire. Mesmo atirado para a prisão, com brutalidade e sem motivo, comenta:
"Isto aqui não é assim tão mau. Esta tarimba é de madeira afagada."
Ao pé das arbitrariedades atravessadas pelo subalterno Švejk, a ideia do estado
de excepção, que Agamben anda a vender há anos, mal chega para assustar
crianças. O riso constante nunca tapa a tragédia vigente e declara a cada passo
que ela é de facto ridícula e, afinal, estúpida e rasteira. O seu único símbolo
é este "herói aleijado", contemporâneo dos K. e dos Samsa mas em cuja
língua (checa e alemã) se pode escrever "Para a guerra nós não vamos, para
ela nós cagamos." Agora, que recai "sobre a Europa a verdade de que o
amanhã desfaz os planos do presente", este Švejk, cujo tradutor pôs no
topo da colecção humorística de Ricardo Araújo Pereira, é vital para a nossa
paz de europeus sem ilusões. G.R.
2. Já Então a Raposa Era o Caçador, Herta Müller
Nesta alegoria trágica são silenciosas as ruas do poder. Há sombras amargas na noite daquela cidade insana. Como uma presença maligna e demente, o medo atravessa os dias, entranha-se, faz-se de morto. Uma realidade que a escrita de Müller acorda e estilhaça. As palavras adensam-se, já só há linguagem simbólica, magma onírico. Entre o silêncio e a escrita. J.R.D.
3. A Piada Infinita, David Foster Wallace
Foster Wallace desejou construir, à semelhança de
Shakespeare - a quem roubou o título, a partir de uma fala de Hamlet sobre
Yorick, o bobo que dizia verdades inomináveis - uma cosmogonia delirante e tão complexa
como o mundo. Terá morrido ao tentá-lo, mas o resultado reflecte bem a sua
ousadia. H.V.
4. Arco-Íris da
Gravidade, Thomas
Pynchon
Em tempo de caudalosos rios de informação e de
calhamaços leves, 39 anos depois de publicado originalmente, este livro chega a
Portugal ainda com fôlego para nadar contracorrente nesses rápidos binários que
nos encandeiam e desafiar os nossos limites como leitores. Ninguém sai da
experiência incólume, que para isso está a grande literatura. A.R.
5. Contos
Completos, Lydia
Davis
A ausência de enredo que caracteriza os contos
breves de Lydia Davis mais não é do que uma maneira hábil de esconder a
desolação metafísica em que as personagens se debatem. Com uma escrita lúcida,
concisa e original, e num tom que é uma máscara para o reconhecimento da
impossibilidade da felicidade, Davis consegue contornar as expectativas
imediatas dos leitores. J.R.D.
6. Mel, Ian McEwan
Uma extraordinária capacidade narrativa, a criação
de uma personagem feminina credível, a reconstituição de uma época (anos 1970)
feita de medo, desconfiança, logro e traição. Um romance histórico, um
thriller, uma reflexão sobre o Zeitgeist em que o autor questiona continuamente
as ingerências da realidade na ficção e vice-versa. H.V.
7. Todas as Palavras, Manuel António Pina
O caminho foi sempre o da procura da palavra. A
certa. Desde 1974, quando começou a publicar poesia com um título cujas
palavras, no momento desta escrita, são só sentido, como ele queria: Ainda Não
É o Princípio Nem o Fim do Mundo Calma É Apenas um Pouco Tarde. Manuel António
Pina morreu em Outubro deste ano e deixou Todas as Palavras, a antologia
poética. Uma casa. I.L.
8. Um Sopro
de Vida (Pulsações), Clarice
Lispector
Clarice Lispector escreve como ninguém. É uma clave
verbal diferente - desde o primeiro livro até este, o último, editado já depois
da sua morte em 1977, e escrito e/ou ditado à sua grande amiga, Olga Borelli
(em parte no hospital, até ao dia antes de morrer). Este livro, e Clarice sabia
que estava a morrer, densifica e depura, intensificando pungente e
dramaticamente os traços da escritora. De uma beleza lancinante. M.C.C.
Um prédio de águas rejuvenescedoras na Luanda
perdida pelo dinheiro, acossada pela ambliopia, condenada ao fogo pela
ganância, onde transparência e leveza servem o paradoxo de emprestar
visibilidade a quem até aí nem se via. A maturidade com que Ondjaki trabalha o
português angolano é digna dos melhores ourives da língua. A.R.
10. (ex-aequo) Os Enamoramentos , Javier Marías
Ao 13.º romance, o catalão Javier Marías volta com
a voz de uma mulher, María Dolz, para falar de amor. Funcionária de uma
editora, este primeiro "eu" feminino de Marías entretém-se a observar
a felicidade de um casal enquanto toma o pequeno-almoço no sítio de sempre. Com
este livro, Marías quebrou a promessa de abandonar a literatura. Não precisa de
se redimir. I.L.
10. (ex-aequo) Poesia Reunida, Maria do Rosário
Pedreira, Quetzal
Maria do Rosário Pedreira era, até Poesia Reunida
sair este ano na Quetzal, daqueles poetas que têm uma legião de fãs mas toda a
obra esgotada. Só por isso, este livro já era imprescindível. Mas além de A
Casa e o Cheiro dos Livros (1996), O Canto do Vento nos Ciprestes (2001) e
Nenhum Nome Depois (2004), Poesia Reunida traz um livro inédito, A Ideia do
Fim. Mesmo perante o fim, há ressurreição nesta nova fase - mas sem se perder o
medo. I.C.
Escolhas de António
Rodrigues, Diogo Ramada Curto, Gustavo Rubim, Helena Vasconcelos, Isabel
Coutinho, Isabel Lucas, José Riço Direitinho, Luís Miguel Queirós, Maria
Conceição Caleiro e Rui Lagartinho (da lista completa)
Vem descobrir alguns destes livros na nossa Biblioteca.
Boas leituras!
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